No curso de medicina não há, essencialmente, formação sobre saúde. Os doentes saem das consultas com prescrições de drogas ou marcações cirúrgicas, porém, largamente desprovidos de directrizes fidedignas para afectar a causa subjacente – na vasta maioria dos casos oriunda de disfunções dietéticas. Isto porque, apesar da monumentalidade da evidência que relaciona a nutrição com a saúde, o seu ensino é inteiramente ausente ou altamente precário.1 Uma análise indicou que, em média, os médicos têm menos de 20 horas de educação dedicada à nutrição em 4 anos de estudo e sem qualquer relação aparente com a incidência de doença.2 Ainda assim, a população considera os médicos como umas das fontes mais fidedignas de informação sobre nutrição.3
Sendo um facto inequívoco que a dieta exerce uma influência determinante na etiologia das doenças crónicas, como é possível incumbir credibilidade à posição assumida pelos profissionais de saúde, ou confiar nas suas promulgações, visto que pouco sabem? Apesar de subestimarem a importância da nutrição e revelarem um grau elevado de noções equivocadas, frequentemente, a falta de conhecimento não é reconhecida como um impedimento aos aconselhamentos.4,5 A prepotência de alguns médicos, que utilizam o diploma como forma enganadora de justificarem as suas posições ignorantes, atinge facilmente um povo desconhecedor das incríveis lacunas formativas. As consequências são óbvias: pacientes que sofrem mais e morrem mais cedo por seguirem recomendações ingénuas.
Num estudo, a orientação médica para o tratamento da doença cardiovascular – permissiva de fontes de gordura saturada e colesterol – provocou um aumento de 186% na frequência de angina, em oposição a uma redução de 91% proveniente de uma dieta cientificamente correcta.6 No tratamento da diabetes – outro exemplo peremptório da ignorância médica – é expectável que os pacientes definhem de doença cardiovascular e problemas renais por causa da dieta sugerida, rica em calorias de origem animal e pobre em hidratos de carbono.7 A doentes com cancro, para minimizar o elevado risco de infecção induzido pela quimioterapia, a medicina recomenda uma dieta estéril (neutropénica), cuja primeira premissa visa a cessação do consumo de frutas e vegetais frescos. No entanto, as frutas e os vegetais são os alimentos mais saudáveis e, consequentemente, os mais relevantes na dieta de doentes oncológicos, que apresentam níveis insuficientes dos compostos que os caracterizam. Por essa razão, a evidência indica que a sua remoção dietética aumenta o risco de infecções, não o previne.8,9
Confiar nos aconselhamentos médicos pode conduzir a desenlaces altamente desfavoráveis.
AS CAUSAS DA DISFUNÇÃO
As principais barreiras que condicionam a medicina de uma forma tão determinante relacionam-se com vastos conflitos de interesse, não só com as indústrias que lucram com os tratamentos vigentes, mas também com as que vendem os produtos que contribuem para o tipo de doenças para os quais esses mesmos tratamentos são direccionados. De facto, a estrutura da profissão está construída a partir de um paradigma que exorta a rentabilidade, em detrimento da força das conclusões científicas ou da qualidade de vida dos doentes.10,11,12,13
Outro impedimento à aceitação e divulgação de padrões dietéticos saudáveis prende-se com as viciações alimentares que vitimizam tanto a população, em geral, como a comunidade médica. Já nos anos 80, quando os malefícios estavam largamente difundidos, não era incomum a um médico ceder um cigarro a um paciente acamado, que era aceso em pleno hospital. Actualmente, o cenário vivencia-se na alimentação: os médicos comem aquilo que, pelo menos, suspeitam ser prejudicial, e autorizam que os seus doentes consumam o mesmo tipo de alimentos que quase os matou.14
É na coragem de suplantar as constrições pessoais e financeiras em prol da atenção descomprometida à saúde que o médico corresponde ao estatuto da sua própria profissão.
QUE DIETA DEVERIAM PROMOVER
OS PROFISSIONAIS DE SAÚDE?
Os estudos indicam que os médicos deveriam recomendar um dieta vegetariana, não processada e baixa em gordura, a todos os seus pacientes.15,16 A mortalidade por doenças crónicas é significativamente mais baixa em vegetarianos do que em populações omnívoras.18,19 Em adição, o poder terapêutico da dieta saudável é de tal forma eficaz, que pode ser capaz de deter ou reverter a progressão de doença cardiovascular, de diabetes e de cancro.20,21,22
Os profissionais que desvalorizam a sugestão com base no suposto desinteresse dos doentes ignoram os dados que indicam precisamente o oposto, não só porque a dieta funciona na supressão dos sintomas, mas também porque é prazerosa.23,24 Os investigadores de um estudo sobre a adesão e os efeitos do consumo de uma dieta vegetariana saudável que pretenderam retornar os pacientes à sua dieta anterior – para avaliarem as alterações consequentes – depararam-se com uma recusa por parte dos participantes, que tinham perdido peso e dores, e ganho energia, uma digestão eficiente e qualidade do sono, em conjunto com satisfação dietética.25
Esperançosamente, no futuro, a actual cooperação com a indústria alimentar – um dos calcanhares de Aquiles do progresso da medicina – será encarada de uma forma tão prepóstera como são, actualmente, os antigos cartazes de cooperação com a indústria do tabaco.
10 – Institute of Medicine, Board on Health Sciences Policy, Committee on Conflict of Interest in Medical Research, Education, and Practice. (2009) Conflict of Interest in Medical Research, Education, and Practice. The National Academies Press.
11 – Richard Smith. Conflicts of interest: how money clouds objectivity. J R Soc Med. 2006 Jun; 99(6): 292–297.
12 – Marcia Angell. Drug companies and doctors: A story of corruption. January 15, 2009. The New York Review of Books 56.
13 – Brezis M. Big pharma and health care: unsolvable conflict of interests between private enterprise and public health. Isr J Psychiatry Relat Sci. 2008;45(2):83-9; discussion 90-4.
14 – Neal D. Barnard, MD. The Physician’s Role in Nutrition-Related Disorders: From Bystander to Leader. Doctors and hospitals must stop being bystanders to food-related illness and begin to become role models and educators in the transition to healthful eating habits, just as they did in tobacco cessation. Virtual Mentor. April 2013, Volume 15, Number 4: 367-372.
25 – Neal Barnard, Anthony R. Scialli, Patricia Bertron, Donna Hurlock, Kalia Edmonds. Acceptability of a Therapeutic Low-Fat, Vegan Diet in Premenopausal Women. Journal of Nutrition Education and Behaviour. November 2000 Volume 32, Issue 6, Pages 314–319