ARTIGOS

A INDÚSTRIA DO CANCRO

As células de um qualquer órgão podem ser expostas a condições que proporcionam a sua mutação para versões mais primitivas, nas quais perdem o predeterminismo que mantêm as características de comportamento normal. Nesse caso, podem começar a desenvolver-se independentemente do tecido a que pertencem e adquirir a capacidade de colonizar outros tecidos – num processo conhecido como metastização – o que as torna tipicamente cancerígenas. Quanto maior o grau de diferenciação que as células adquirem em relação ao tipo de tecido a que pertencem, mais indiscriminado se torna o seu crescimento e propagação, o que caracteriza o seu grau de malignidade. Estados fisiológicos que favorecem a carcinogénese, em simultâneo com a exposição a agentes cancerígenos, criam as condições ideais para o desenvolvimento de cancro.1,2

A ABORDAGEM MÉDICA:
QUIMIOTERAPIA E RADIAÇÃO

Os meios de tratamento convencionais, que residem na administração de quimioterapia e de radiação, devem ser considerados conservadoramente, uma vez que não curam a maioria dos cancros, e a sua capacidade de os remitir pode promover uma ilusão de escape, inexistente pela via proposta, em simultâneo com a deterioração do paciente. Apesar de constituírem um ataque agressivo ao tecido doente, destroem simultaneamente o tecido saudável, o que compromete a sensatez de uma abordagem com um grau de eficácia medíocre.

A noção da superioridade do tratamento convencional emana do preconceito generalizado de que a medicina encerra as metodologias mais sofisticadas para suprimir a doença – um estatuto legado pela força da construção social. É legítimo para o desconhecedor considerar que a solução mais eficaz deve provir de um sistema que se conjuga tão megalomanamente em termos de infra-estrutura e recursos, e subestimar que essa dimensão foi proporcionada precisamente pela capacidade de providenciar tratamentos rentáveis, não necessariamente os mais eficazes. Expectavelmente, a postura da indústria de cuidados de saúde assume o enredo da recuperação com uma esperança que esconde o defraudamento.

Num estudo, 69% dos doentes com cancro do pulmão e 81% dos doentes com cancro do intestino consideravam equivocadamente que a quimioterapia era curativa. No entanto, a quimioterapia não cura a maioria dos cancros, e o benefício de sobrevivência – quando existe – é medido em semanas ou meses, e está associado a uma toxicidade indesejável.3 O falso optimismo é patente durante o primeiro ciclo de quimioterapia e evidencia-se principalmente quando o cancro desaparece no raio-X. Posteriormente, se o tumor voltar a recorrer, tende a desvanecer-se – mas subsequentes ciclos de quimioterapia podem reacender a esperança. A constatação sobre a prognose pobre surge principalmente pela verificação da deterioração física e pelo contacto com doentes que, num estado mais avançado, estão a morrer.4

Uma análise compreensiva de estudos que examinaram o valor da quimioterapia no tratamento do cancro concluiu que, à parte do cancro do pulmão, não havia evidência directa de que prolongasse a sobrevivência, e que, excepto no cancro do ovário, a evidência indirecta suportava a ausência de efeitos positivos. No tratamento desses dois tipos de cancro o benefício terapêutico era, na melhor das hipóteses, pequeno e o tratamento menos agressivo funcionava, pelo menos, tão bem como o usual. Os autores concluíram que a noção que os oncologistas têm em relação à melhoria de sobrevivência legada pela quimioterapia não é suportada pela evidência.5

Outra análise sobre os efeitos da quimioterapia, que deve ser vista como o limite superior de eficácia uma vez que os benefícios podem ter sido sobrestimados para alguns tipos de cancro, indicou que a contribuição curativa e adjuvante da quimioterapia para a sobrevivência em 5 anos é de 2.1%. Isto é, na hipótese mais remota, há 2.1% de aumento de sobrevivência – de semanas ou meses – com o uso de quimioterapia em comparação a fazer absolutamente nada. Os investigadores indicaram que, em vista do impacto negligenciável da quimioterapia na sobrevivência e da falta de qualquer progresso significativo nas últimas décadas, considera-se que o seu papel principal incide no controlo de sintomas. No entanto, ele é raramente reportado, e para a maior parte dos pacientes que respondem a sobrevivência é inferior a um ano. Mais uma vez, foi concluído que a suposição médica de que a quimioterapia melhora significativamente a sobrevivência é incorrecta, apesar de novas e caras combinações de drogas.6

Dependendo do tipo de quimioterapia, os seus efeitos nocivos são extensos: danos cardiovasculares, visuais, cerebrais, intestinais e imunitários, que resultam em distúrbios cognitivos, angina, anemia, sangramento, vómitos, diarreia, náusea, anorexia, perda de cabelo, febre, etc.. Por exemplo, uma das drogas quimioterapêuticas mais usadas, o tamoxifeno, apesar de poder reduzir o risco de cancro da mama, aumenta o risco de cancro do endométrio, de coágulos sanguíneos nos pulmões, de enfarte, tromboses, cataratas e sarcoma uterino – uma incomum e perigosa forma de cancro do útero. A severidade dos efeitos levou à criação do termo “substituição da doença” – porque, ao invés de cancro da mama, contrai-se uma outra doença qualquer, possivelmente mais mortal.7

De forma semelhante, a terapia de radiação é conhecida como sendo mutagénica, carcinogénica e teratogénica, e está associada a toxicidade e sequelas graves que podem ocorrem meses ou anos depois de a terapia terminar. O uso de radiação no tratamento do cancro pode estar relacionado com o aumento da mortalidade e da diminuição da sobrevivência nos doentes irradiados.8

A comunidade médica tende a não revelar que o tratamento proposto pode defraudar as expectativas.

A POSTURA MÉDICA

Alguns indícios da decadência dos tratamentos ortodoxos, e da sua subjugação comercial, relacionam-se com a substância da prática médica, de personalidade manifestamente comprometida. Por exemplo, uma análise determinou que os oncologistas não estavam dispostos a aceitar o tratamento que eles próprios providenciavam, e que usavam as drogas pelas quais recebiam mais dinheiro, o que sugere desinformação dos pacientes e má prática.9

No final dos anos 90, houve investigações a confirmar que as seguradoras pagavam mais 34% a 85% pelas drogas quimioterapêuticas do que os médicos, porém, após a instituição de reformas que impediram essas disparidades, uma análise revelou que o tipo de drogas usadas na quimioterapia mudou de acordo com a resposta médica à alteração de incentivos. A administração de drogas que perderam margens de lucro diminuiu e o uso da droga mais cara aumentou.10

Outro problema comum reside no sobre-tratamento: muitos pacientes recebem quimioterapia mesmo se o tipo de cancro não é responsivo às drogas ou durante o final de vida – quando os tratamentos são significativamente mais lucrativos – o que foi relacionado com a motivação financeira dos médicos.11

Por que razão os oncologistas providenciam tratamentos aos quais não aceitariam submeter-se? Provavelmente, porque são beneficiados financeiramente por tratamentos ineficazes e altamente danosos.

EXPLORAÇÃO DISFARÇADA DE PREOCUPAÇÃO

A indústria do cancro transpira uma natureza mercantilista que subjuga as necessidades da saúde. Os principais intervenientes cooperam estrategicamente numa cadeia extorsionista que alegadamente zela pela erradicação do cancro e defesa dos doentes. As próprias sociedades “Contra o Cancro” aparentam estar mais interessadas em capitalizar com a estrutura em voga, do que em promover verdadeiros métodos preventivos. O tema altamente sensibilizante serve como isco ideal para a manipulação pública, assim como para angariar clientes rentáveis – os doentes com (e sem) tumores, iludidos pelo imbróglio médico.

Um exemplo peremptório reside nos esforços coercivos de canalizar mulheres susceptíveis para exames mamográficos. Um produtor principal de químicos cancerígenos, a Imperial Chemical Industries, após produzir a droga tamoxifeno para tratar o cancro da mama – através do seu derivativo Astra Zeneca Pharmaceuticals – começou a patrocinar o mês do cancro da mama em 1984, com o slogan prepóstero “Detecção prematura é a melhor prevenção” – campanhas essas que vigoram até aos dias de hoje, simbolizadas por laços cor-de-rosa.12 Porém, uma extensa revisão da evidência sobre a mamografia indica que a informação propagandeada pelas agências de caridade, e outros grupos de interesse, é enganadora, tendenciosa e errada. Uma mulher saudável que se sujeita à mamografia com o intuito de diagnosticar ou tratar atempadamente o cancro da mama tem muito mais hipóteses de ficar doente ou de perder a mama caso se sujeite ao exame. Se 2000 mulheres se submeterem regularmente à mamografia durante 10 anos, uma pode beneficiar do teste e evitar morrer de cancro por causa da detecção prematura, no entanto, 10 mulheres saudáveis vão ser tratadas desnecessariamente para um cancro que não possuem. Esse tratamento pode envolver a remoção parcial ou completa do seio, assim como radioterapia ou quimioterapia, o que aumenta as suas hipóteses de morrerem, por exemplo, de doença cardíaca e de cancro. Além disso, se 2000 mulheres forem testadas regularmente durante 10 anos, cerca de 200 mulheres saudáveis experienciam um falso alarme que pode resultar em stress psicológico severo passível de durar vários meses – até saberem se têm ou não cancro – o que as torna mais vulneráveis à doença e à indústria médica.13

É do senso comum que um cancro encontrado não foi prevenindo, e do consenso científico que o recurso generalizado à mamografia aumenta as chances de adoecer, não as previne. Aparenta que a Liga Portuguesa Contra o Cancro continua a perpetuar os slogans fraudulentos impostos pela indústria farmacêutica…

A famosa campanha de sensibilização e “prevenção” do cancro da mama foi instituída por uma companhia que não só produz químicos cancerígenos, mas também a droga principalmente usada no tratamento quimioterapêutico do cancro da mama…  A “luta contra o cancro” é movida por uma hipocrisia obscena…


 1 – Cooper GM. (2000) The Cell: A Molecular Approach. 2nd edition. Sinauer Associates Inc; 2nd edition (July 15, 2000)
2 – National Institutes of Health (US); Biological Sciences Curriculum Study. Bethesda (MD): National Institutes of Health (US); 2007.
3 – Jane C. Weeks, M.D., Paul J. Catalano, Sc.D., Angel Cronin, M.S., Matthew D. Patients’ Expectations about Effects of Chemotherapy for Advanced Cancer. N Engl J Med 2012; 367:1616-1625October 25, 2012
4  – The AM, Hak T, Koëter G, van Der Wal G. Collusion in doctor-patient communication about imminent death: an ethnographic study. BMJ. 2000 Dec 2;321(7273):1376-81.
5 – Abel U. Chemotherapy of advanced epithelial cancer–a critical review. Biomed Pharmacother. 1992;46(10):439-52.
6 – Morgan G, Ward R, Barton M. The contribution of cytotoxic chemotherapy to 5-year survival in adult malignancies. Clin Oncol (R Coll Radiol). 2004 Dec;16(8):549-60.
7 – Fugh-Berman A, Epstein S. Should healthy women take tamoxifen? N Engl J Med.327(22):1596-7, 1992
8 – Jan Stjernswärd. Decreased Survival Related To Irradiation Postoperativelu in Early Operable Breast Cancer. The Lancet Volume 304, Issue 7892, 30 November 1974, Pages 1285–1286 Originally published as Volume 2, Issue 7892
9 – Earle CC, Landrum MB, Souza JM, Neville BA, Weeks JC, Ayanian JZ. Aggressiveness of cancer care near the end of life: is it a quality-of-care issue? J Clin Oncol. 2008 Aug 10;26(23):3860-6.
10 – Mireille Jacobson. Expert Voices: Expect the Unexpected? Physicians’ Responses to Payment Changes. National Institute for Health Care Management, December 2010
11 – Scott Gottlieb. Chemotherapy may be overused at the end of life. BMJ 2001;322:1267
12 – Phaedra C. Pezzullo. Resisting “national breast cancer awareness month”: the rhetoric of counterpublics and their cultural performances. Quarterly Journal of Speech Volume 89, 2003 – Issue 4.
13 – Peter C Gøtzsche, Karsten Juhl Jørgensen. Screening for breast cancer with mammography. Cochrane Centre.

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